• Home
  • Quem Somos
  • Contato
  • ENG
  • POR
  • ESP
  • Sala de Notícias
    • Arte&Sexualidade
  • Biblioteca
    • Publicações SPW
    • Anúncios mensais
    • Multimídia
    • Newsletters
    • Recomendamos
      • Publicações e Artigos
      • Links
  • Análises Estratégicas
  • Pesquisa & Política
  • Atividades SPW

Sala de notícias

Enfrentando uma nova epidemia: consequências do Zika vírus para a saúde pública e os direitos reprodutivos

22 fev 2016


Zika 2

Declaração da Campanha Internacional pelo direito das mulheres ao aborto seguro

A  OMS prevê até quatro milhões de casos de Zika vírus transmitido por mosquito neste ano.

 Nas últimas semanas, houve uma explosão de artigos de notícias e declarações na imprensa mundial sobre o vírus Zika. Artigos escritos por ativistas que defendem o direito ao aborto têm reivindicado que leis de aborto restritivas sejam revistas para legalizar a prática, seja amplamente, seja por razões terapêuticas ou apenas em relação à infecção Zika. Mas vale lembrar que em países como El Salvador e na Nicarágua o aborto é ilegal mesmo para salvar a vida da mulher. Nesses casos cabe perguntar: por que seriam feitas reformas legais em razão dos efeitos da Zika?

Vários desses artigos relembram que nos EUA, nas décadas de 1950 e 1960, anomalias fetais causadas pela rubéola e pela talidomida, tão graves quanto aquelas associadas à Zika, contribuíram para a decisão tomada pela Suprema Corte dos Estados Unidos em 1973 quando afirmou que o aborto é uma questão a ser decidida entre a mulher e seu médico. Vale dizer, porém, que essa decisão da Corte já estava a caminho independentemente das crises da rubéola e da talidomida. E esse é o ponto que importa. A reforma legal só é provável quando o terreno político para que isso aconteça já esteja preparado. No caso de uma epidemia tão grave como a que parece anunciada pelo vírus Zika, o significado de “preparar o terreno” não se limita aos aspectos relativos à lei do aborto, mesmo quando a pauta do aborto legal e seguro seja muito importante.

Uma analogia pode ser feita também em relação ao que aconteceu quando se constatou que o HIV era transmitido durante a gravidez e pela amamentação (transmissão vertical), causando graves problemas de saúde, aborto espontâneo, natimortos e morte precoce em milhões de crianças, bem como causando a morte das mães. Muito tempo transcorreu antes que o problema fosse reconhecido e investigado e, sobretudo, para que fosse desenvolvido um tratamento eficaz para prevenir a transmissão vertical e implementar a oferta desse tratamento por instituições de saúde públicas que alcançassem grande parte das populações afetadas, especialmente nos países pobres. Ainda hoje, passados 30 anos desde que se iniciou a epidemia do HIV/AIDS, essa continua sendo uma tarefa inconclusa.

A epidemia da sífilis, muito mais antiga do que a do HIV/AIDS, é outro exemplo cabal. A sífilis também é transmitida verticalmente das mulheres grávidas para os bebês. Há muitas décadas, a rotina de cuidados pré-natais inclui protocolos de testagem e tratamento de mulheres grávidas com sífilis. No entanto, foi apenas em junho de 2015 que a Organização Mundial da Saúde (OMS) anunciou que num único país (Cuba) a transmissão de mãe para filho do HIV e da sífilis havia sido finalmente erradicada. 

 O mesmo mosquito que transmite a dengue e várias outras doenças tropicais transmite a Zika. A microcefalia parece ser uma consequência da infecção Zika. Mas devemos nos perguntar o que mais este vírus pode causar – não só durante a gravidez — mas também em pessoas adultas e crianças?  É vital, portanto, examinar o problema da Zika a partir de uma perspectiva mais ampla de saúde pública, a qual exige acesso a grande volume de conhecimentos e a insumos tecnológicos. Também é fundamental ter muita cautela quanto ao que pode ser alcançado e em quanto tempo e, portanto, definir com muita precisão o que devemos e podemos reivindicar.

Esta declaração sintetiza o que os especialistas em saúde pública, gravidez e direitos reprodutivos estão dizendo e recomendando com base no conhecimento que dispomos, nesse momento, sobre o a crise da Zika.

Questões-chave e recomendações sugeridas por especialistas

Nos países onde já se sabe mais sobre a disseminação do vírus, a Zika expôs a fragilidade de resposta dos sistemas públicos de saúde diante de novas epidemias, especialmente no âmbito da atenção primária. A doença também expôs as deficiências na oferta de serviços de saúde reprodutiva para as mulheres, tanto em relação à informação e aos cuidados durante e após a gravidez, quanto em relação à prevenção e à interrupção da gravidez.

 Cinco grandes áreas de atenção devem ser enfatizadas em relação à Zika:

1. A eliminação do mosquito que transporta o vírus Zika, dengue e outras doenças, e, se possível, a eliminação de todos os mosquitos

Volnei Garrafa, da Universidade de Brasília e da Cátedra de Bioética da UNESCO, um líder nacional do campo da bioética no Brasil, disse, numa entrevista ao IPS,  que o governo brasileiro quer manter a sociedade responsável pela luta contra o mosquito, sem assumir a sua própria responsabilidade pela falta de saneamento adequado e pelo “lixo e água estagnados em todos os lugares”, que geram condições perfeitas para criadouros do mosquito.  Mais de uma milhão de pessoas morrem a cada ano em razão de enfermidades transmitidas por mosquitos e outras centenas de milhões experimentam sofrimento e dor por efeito dessas doenças. A Malária afeta 350-500 milhões de pessoas a cada ano e a Dengue afeta 400 milhões, com enormes custos para os países em que essas doenças são endêmicas.

2.  Políticas públicas, planejamento e mudanças econômicas que irão reduzir as alterações climáticas e seus efeitos adversos na saúde e na doença

O aumento das doenças transmitidas por mosquitos está ligado aos efeitos adversos das alterações climáticas, como o aumento das temperaturas e mudanças na precipitação. Os cientistas dizem que no longo prazo as mudanças climáticas tornarão cada vez mais difícil proteger os seres humanos de tais doenças e da rápida propagação do Zika vírus em alguns meses.

3.  Melhorias significativas na comunicação das condições incomuns identificadas durante a gravidez e o parto, de modo a promover o reconhecimento precoce de novas doenças que afetam a gravidez, tal como sublinhado pelo Observatório de Política e Sexualidade/SPW. 

 4.  Acesso universal ao cuidado pré-natal, que fornece diagnóstico de doenças, inclusive para detecção do  vírus Zika;  apoio social para as mulheres cujos filhos foram afetados pela Zika e suas famílias devem estar disponíveis, especialmente no caso de crianças com deficiências graves.

As orientações da OMS sobre cuidados pré-natais incluem:

 medidas preventivas, incluindo imunização (especialmente do tétano) e rastreio de doenças subjacentes e doenças como anemia, malária, infecções sexualmente transmissíveis (especialmente a sífilis e o HIV/AIDS), problemas de saúde mental subjacentes e/ou sintomas de estresse ou violência doméstica, reconhecimento e controle de complicações relacionadas com a gravidez, reconhecimento e tratamento de doença subjacente ou concomitante.

Como bem afirmou Débora Diniz, professora de direito na Universidade de Brasília e integrante do Instituto Anis de Bioética em Brasília, em uma entrevista à BBC:

“Esta é uma batalha de saúde pública contra os mosquitos e um problema relativo aos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres. As mulheres com maior risco de contrair o vírus Zika nem sequer têm acesso a cuidados pré-natais, então elas não podem obter um diagnóstico pré-natal do vírus Zika“.

5.  O acesso universal à educação, informação e serviços de saúde da atenção primária, inclusive aqueles que permitirão a indivíduos e casais tomar decisões informadas sobre os seus corpos, sobre gravidez e a regulação da sua fertilidade, assim como acesso aos meios necessários para implementar essas decisões.

O surto de Zika traz à tona a importância dos sistemas de saúde da atenção primária na identificação, prevenção, tratamento e controle das doenças infecciosas. Em relação aos cuidados de saúde reprodutiva, além de cuidados integrais na gravidez, isso inclui o acesso a toda a gama de métodos anticoncepcionais que impedem a gravidez e a transmissão sexual de doenças, contracepção de emergência e serviços de aborto seguro.

Diniz e seus colegas no Brasil, onde as pesquisas e discussões sobre o vírus estão mais avançadas,  compartilharam uma posição clara em relação a essa pauta:


”O aborto é um crime no Brasil, com apenas três exceções: em caso de estupro, quando a vida da mulher está em risco e em caso de fetos anencéfalos. Em 2004, fiz parte do grupo de pessoas que propôs a estratégia de uma ação constitucional, que levou à decisão de 2012 do Supremo Tribunal Federal no sentido de ampliar o direito ao aborto para as mulheres grávidas com fetos anencéfalos.

 Dada a epidemia do Zika vírus, sua associação com síndromes neurológicas fetais, e a emergência de saúde pública de preocupação internacional declarada recentemente pela OMS, estamos preparando um novo caso perante o Supremo Tribunal Federa.

Nossa demanda não é o aborto em caso de microcefalia – que é uma descrição incorreta de uma possível associação entre o vírus Zika e as singularidades fetais. Pensamos que é mais apropriado usar os termos definidos pela OMS, ou seja, malformações congênitas e complicações neurológicas. Nossas reivindicações são as seguintes:


a.  Um pacote integral de cuidados de saúde sexual e reprodutiva para todas as mulheres, com foco especial nas mulheres que vivem em zonas epidêmicas. Essas mulheres estão em situação de vulnerabilidade, são pobres, em sua maioria pretas e pardas e ​​com pouco acesso às políticas sociais. Nós exigimos a inclusão do diagnóstico laboratorial ou clínico para a infecção por vírus Zika como rotina no pré-natal no Brasil (ou o melhor exame diagnóstico disponível pela ciência);



b.  O direito à informação adequada relacionada à epidemia, seus riscos e possibilidades de planejamento reprodutivo (o planejamento familiar é um direito constitucional no Brasil e para a construção do caso devemos reformular nosso vocabulário acadêmico e político dos direitos sexuais e reprodutivos para falar em planejamento familiar e proteção à maternidade e à infância);



 c.  O direito ao aborto legal e seguro para mulheres grávidas, enquanto a epidemia persistir. Nós não estamos exigindo o direito ao aborto em caso de diagnóstico específico para o feto. Estamos exigindo o direito de que as mulheres não fiquem sujeitas à tortura psicológica de viver uma gravidez imposta num contexto em que grassa uma epidemia causada pela negligência de muitas décadas na implementação de políticas públicas nacionais voltadas para a eliminação do mosquito. Como em qualquer tema de direitos reprodutivos, direito ao aborto refere-se a uma escolha, nunca uma imposição.

 d.  Para as mulheres afetadas pelo vírus Zika e recém-nascidos com a síndrome neurológica, vamos exigir uma política de proteção social focada na maternidade e na infância, uma demanda imediata são políticas de transferência de renda por meio do Benefício de Prestação Continuada (BPC) sem recorte de renda, tal como é hoje estabelecido por lei.


 A rápida propagação do vírus Zika levou vários governos –  como o de El Salvador –  a recomendar às mulheres que não engravidem nos próximos dois anos. No entanto, o acesso a contraceptivos e à educação em saúde reprodutiva no país são muito limitados, e o aborto é proibido em todas as circunstâncias. Assim, os mesmos governos que negam às mulheres o controle sobre seus corpos estão pedindo agora que essas mesmas mulheres controlem seus corpos até 2018. Débora Diniz também disse em sua entrevista à BBC:

“Os movimentos contrários ao direito ao aborto protestaram contra a descriminalização do aborto em casos de fetos anencefálicos no Brasil em 2012, argumentando que a vida começa na concepção. Eles estão agora argumentando que o aborto de fetos microcéfalos equivale a “eugenia” ou reprodução seletiva, e comparam aqueles que defendem o direito ao aborto nesses casos com os nazistas. Mas a eugenia ocorre quando o Estado intervém na tomada de decisões de forma autoritária, exercendo controle sobre a gravidez das mulheres, e não quando a ideia é que as mulheres sejam livres para tomar suas próprias decisões de planejamento reprodutivo”.

A epidemia de Zika já se espalhou por mais de 25 países na América Latina, uma região onde 97% das mulheres em idade fértil vivem sob leis de aborto muito restritivas, de acordo com o Instituto Guttmacher.

No dia 05 de fevereiro de 2016, o Alto Comissário da ONU para os Direitos Humanos, Zeid Ra’ad Al Hussein, emitiu um comunicado que aponta para os riscos enfrentados pelas mulheres que não contam com acesso a serviços de saúde reprodutiva. “Medidas concretas devem ser tomadas”, disse ele, para que as mulheres tenham informações, apoio e serviços necessários para exercer os seus direitos para determinar:

” Se e quando engravidar… A defesa dos direitos humanos é essencial para uma resposta eficaz de saúde pública e isso exige que os governos assegurem às mulheres, homens e adolescentes o acesso a serviços de saúde sexual e reprodutiva de qualidade e abrangentes, além de informações, sem discriminação.”

O Centro de Direitos Reprodutivos e outros signatários, em uma carta enviada ao Ministério da Saúde de El Salvador, instam as autoridades de saúde do país a suprimir a proibição total do aborto diante da emergência de saúde pública ocasionada pela Zika. Diz o texto da carta:

“ A recomendação feita pelo governo de que as mulheres adiem gravidez por dois anos não faz sentido quando não é oferecido a elas e suas famílias pleno acesso aos serviços de saúde reprodutiva que necessitam para prevenir, planejar e terminar, com segurança, uma gestação. Na verdade, a ausência de ações nesse sentido, neste momento crítico, só vai piorar a crise de saúde pública. Mais mulheres vão buscar abortos clandestinos que irão colocar suas vidas e saúde em risco. Para protegê-las e suas famílias de forma adequada, as mulheres salvadorenhas devem ter acesso a toda gama de serviços de saúde reprodutiva, incluindo o aborto seguro e legal.”

Estes e outros resumos de notícias sobre o Zika vírus podem ser encontrados nos seguintes boletins da Campanha:

Virus Zika, Saúde Pública e Direitos Reprodutivos – 12/02/2016 

Notícias diversas – 08/02/2016

Aborto: Saúde Pública, Direito e a Política Pública – 03/02/2016

Anomalia fetal, triagem e aborto – 29/01/16

Veja também:

Artigo de Débora Diniz no NYT 


Artigo de Sonia Corrêa no site  SPW

Categoria: Sala de notícias

Compartilhar

Tags

Aborto América Latina antigênero Argentina Brasil China Colômbia conservadorismo conservadorismo religioso Contracepção covid covid-19 Criminalização Defensores DH Direitos das Mulheres Direitos Humanos Direitos Intersex Direitos LGBTQ Direitos Reprodutivos Direitos Sexuais Discriminação economia política EUA Extremismo Religioso feminismo Feminismos gênero HIV/AIDS Identidade de Gênero Igualdade de Gênero ONU Orientação Sexual políticas antigênero Portugal religião Saúde Materna Sexualidade Trabalho Sexual Uganda Uruguai violência Violência Sexual África Ásia Índia

Sexuality Policy Watch

admin@sxpolitics.org
Rio de Janeiro | Brasil

Posts recentes

  • O direito ao aborto legal no Brasil 2023-2025: Ofensivas e Resistências
  • A resolução do CONANDA sobre aborto nos casos legais não é apenas justa, é urgente
  • Comentários feitos em um evento paralelo da CSW co-patrocinado pelos EUA sobre o ataque da ideologia de gênero às mulheres e à família
  • Ordem antigênero de Donald Trump (2025): tradução ao português
  • Ofensiva anti-trans e anti-DEI nos EUA sob Trump
FW2 Agência Digital