No dia 11 de novembro de 2019, em Quito, Equador, as organizações Paz e Esperança e IPRODES, do Peru, e Koinonia Presença Ecumênica e Serviço, membro do Fórum Ecumênico ACT Brasil apresentaram em audiência pública da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) um relatório denunciando o perigo das pautas anti direitos e discursos de ódio na agenda dos Direitos Humanos e no avanço de políticas públicas.
A falácia de gênero, que chamam de “ideologia de gênero” e a apropriação por discursos fundamentalistas, com atenção para as narrativas religiosas, seguem promovendo retrocessos que se agravam e avançam em toda América Latina e Caribe. Como recentemente a Bolívia, em que a Bíblia e a arma são usadas para tomar o poder de um governo eleito democraticamente.
A representação na CIDH não era apenas destas organizações e sim de outras dezenas, desses e de outros países da região para expor as situações de retrocessos que ameaçam e violam os direitos humanos há vários anos.
Como consta no documento apresentado, “nos últimos anos, várias igrejas, coletivos e organizações religiosas conservadoras têm feito um discurso rejeitando o conceito de gênero como categoria de análise, optando por classificá-lo como uma mera “ideologia”. Nesse sentido, enfrentamos uma nova terminologia usada por esse setor da sociedade para evitar a incorporação da abordagem de gênero nas leis e políticas públicas”.
O objetivo foi levar e promover a reflexão sobre os desafios, as normas de boas práticas na promoção e proteção dos direitos à educação, à saúde e ao direito à vida livre da violência, em particular, no que diz respeito às mulheres, população LGBTI+, crianças e adolescentes; e em questões de direitos de gênero, como os direitos sexuais e reprodutivos, em um contexto em que a defesa política dos religiosos fundamentalistas é contrária aos direitos dessas populações.
O pedido de fala durante a Audiência Pública da CIDH foi apresentado pelas organizações peruana e brasileira e foram representadas por Ronald Gamarra, Sofía Carpio do IPRODES, Peru; Marilia Schüller de Koinonia e Fórum Ecumênico ACT Brasil; e Germán Vargas do Paz e Esperança, Peru.
A audiência pública foi presidida por Joel Hernandez Garcia (México) membro da CIDH. Também estavam presentes as seguintes membras da Comissão: Margarette May Macaulay (Jamaica), Luís Ernesto Vargas (Colômbia), Soledad Garcia Muñoz (Argentina), María Claudia Pulido (Colômbia). Lamentavelmente, a representação do Brasil na Comissão não foi designada para estar presente nesta audiência pública.
Marilia Schüller, assessora de KOINONIA nas relações institucionais e internacionais das pautas de Ecumenismo e Justiça de Gênero, relata que a Comissão recebeu com satisfação o relatório apresentado, e expressaram com palavras de agradecimento.
“Ficou bem clara a importância do direito à educação de meninas, meninos e adolescentes e, especialmente da educação sexual nas escolas como parte da formação para a vida; Igualmente a continuidade de políticas públicas que favoreçam mulheres, crianças e população LGBTI+ que são segmentos vulneráveis em nossas sociedades”.
Em denúncia e contraposição ao fundamentalismo religioso, que em nosso contexto de América Latina e Caribe tem sido propagado por setores conservadores cristãos, Marilia completa: “Nós enfatizamos a importância das organizações baseadas na fé estarem ali contribuindo com a reflexão desde uma visão dos direitos humanos e da afirmação da laicidade do estado”.
A exposição da delegação das organizações procurou demonstrar que o cenário da região não pode ser compreendido a partir de percepções simples. É complexo, paradoxal e atravessado por diversos elementos. Nos quais os discursos conservadores, utilizam linguagens, símbolos, valores e instituições democráticas para negar e se opor aos direitos humanos que sustentam essas mesmas instituições.
Quais elementos são esses?
– Oposição à abordagem de gênero através da criação de um discurso e do desenvolvimento do ativismo com base no fantasioso conceito de “ideologia de gênero”;
– As novas formas de participação religiosa na esfera pública;
– As tensões entre o discurso religioso-conservador e a abordagem dos direitos;
– O impacto da agenda civil-religiosa nas normas e políticas públicas relacionadas aos direitos humanos;
– A Instrumentalização do direito à liberdade de crença;
– A inserção do fenômeno religioso em um cenário mais amplo de desdemocratização global desde a segunda década do século 21.
Por fim, a delegação apresentou as seguintes petições à Comissão:
- Desenvolver um relatório regional sobre o “impacto do fundamentalismo religioso na agenda de direitos humanos, principalmente sobre os direitos das crianças e dos adolescentes”, estabelecendo padrões mínimos que os países devem garantir nesses casos proteção dos direitos humanos.
- Que a CIDH exorte aos Estados a garantir o direito à educação sexual e reprodutiva e à saúde de crianças e adolescentes, estabelecendo procedimentos que garantam seu direito à participação e respeitem sua autonomia.
- Que a CIDH recorde aos Estados a sua obrigação de tomar medidas específicas para modificar os padrões socioculturais de comportamentos heteronormativos, incluindo a concepção de programas de educação formal e não formal para combater o preconceito e costumes e todas as outras práticas baseadas na premissa da inferioridade das mulheres e das crianças e adolescentes.
- Que a CIDH lembre os Estados de sua obrigação de garantir a liberdade de crença, sem afetar outros direitos, e garantir o funcionamento dos serviços cuja negação pode pôr em perigo a saúde e a vida das pessoas.
As organizações que apoiaram a ação de incidência foram:
1) Associação Paz e Esperança;
2) Instituto de Promoção do Desenvolvimento Social – IPRODES;
3) KOINONIA Presença Ecumênica e Serviço;
4) ACT Aliança;
5) Fórum Ecumênico ACT Brasil – FEACT Brasil;
6) Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil – CONIC;
7) Coordenadoria Ecumênica de Serviço – CESE;
8) Fundação Luterana de Diaconia – FLD;
9) PAD – Articulação e Diálogo;
10) Monitoramento dos Direitos Humanos no Brasil;
11) Articulação de Mulheres Brasileiras – AMB;
12) Fórum da Amazônia Oriental – FAOR
13) Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma do Sistema Político;
12) SOS CORPO – Instituto Feminista para Democracia;
13) Associação Brasileira de Organizações da Sociedade Civil – Abong;
14) ABIA -Observatorio de Sexualidade e Politica;
15) UNIPOP – Instituto Universidade Popular.
Acesse o documento com o relatório completo aqui (em espanhol)
Fonte: Koinonia