Londres, 22 de janeiro de 2019.
Anti-feminismo e resposta coletiva
Uma mensagem da Professora Clare Hemmings, Diretora do Departamento de Estudos de Gênero da London School of Economics – LSE
Como todos sabem, esses são tempos difíceis. Ataques contra o feminismo e contra feministas estão se tornando frequentes ao redor do globo. Do Brasil à Suécia, o populismo de direita se apoia no racismo, na misoginia e na homofobia para entrincheirar o ódio como
um elemento que é fundamental para o seu crescimento.
Ontem, no dia 21 de janeiro, uma oficina coordenada pela Professora Kimberlé Crenshaw foi interrompida, de forma grosseira e violenta, por um único indivíduo que tentou impedi la de falar, gritou acusações misóginas, ameaçou estudantes e funcionárias e precisou ser
fisicamente removido. Essas tentativas de perturbar espaços feministas são conhecidas. São tentativas que se repetem com o objetivo de silenciar o trabalho feminista e gerar um clima de hostilidade contra práticas feministas, antiracistas e anti-homofóbicas. Esses ataques não são novos, é óbvio, as pessoas que interrogam a “naturalidade” das hierarquias de gênero, raça e sexualidade sempre foram vistas como uma ameaça à “família” e à “nação”. No entanto, esses ataques têm hoje nova intensidade no contexto de crescimento dos populismos e nacionalismos de direita. Por essa razão necessitamos mais do que nunca de teorias interseccionais.
Quero que saibam que o Departamento não vai tolerar ataques contra a liberdade de expressão e integridade intelectual e vai continuar gerando espaços abertos e inclusivos para a discussão de princípios e ideias que são complexas, difíceis e relevantes. À luz dos eventos de ontem, que tentaram minar a nossa oficina de reflexão, podemos assegurar que a pessoa que atacou a professora Crenshaw foi reconhecida pelo sistema de segurança do campus e que tomaremos todas as medidas necessárias para salvaguardar o bem-estar e a segurança das pessoas que frequentam nossos eventos públicos, ao mesmo mantendo nos fieis aos princípios do debate e da participação aberta, que é central na produção de conhecimento feminista e para a LSE como um todo.
Eu fiquei pessoalmente muito tocada pela forma como Kim respondeu aos ataques contra ela e sua liberdade de expressão, enquadrando essas agressões no marco do conhecimento e da política interseccional, aos quais ela dedicou a sua vida intelectual. Viveu-se aí um momento de produção de conhecimento feminista e antiracista exemplar e, mesmo quando eu sempre relutaria em colocar os corpos discente e docente em risco pelo bem da política, estou feliz que todas e todos vocês que lá estavam tenham tido o privilégio de vivenciar essa extraordinária e positiva resposta. Nós não seremos silenciadas.
Enquanto trabalhamos (juntas e de forma incansável), por uma ordem social diferente, recomendo o novo artigo de Judith Butler para a revista New Statesman em que ela sublinha as maneiras pelas quais “gênero”, como um objeto de estudo, tem sido construído como uma ameaça ao autoritarismo nacionalista e religioso (leia a tradução do SPW em português).
Kimberlé Krenshaw é advogada americana dos direitos civis e estudiosa da teoria crítica sobre raça. Ela é professora na Faculdade de Direito da UCLA e na Escola de Direito da Universidade de Columbia, onde se especializa em questões interseccionais entre raça e gênero.
Fonte: Blog da LSE Engenderings