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A política sexual em abril e início de maio de 2018

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No Brasil

Marielle presente 50 dias depois!

Ainda não há conclusões sobre os autores da execução de Marielle Franco e Anderson Gomes e a cada dia surgem novos sinais sobre falhas na investigação do crime. Também suscita preocupação o fato de duas testemunhas envolvidas com a milícia, a quem se atribui a responsabilidade pelo crime, terem sido assassinadas.

No plano político, a cena também é deplorável. Na Câmara dos Vereadores do Rio, ao serem votados projetos de lei apresentados pela vereadora, os representantes do dogmatismo religioso impediram que o projeto que obriga maternidades a realizarem abortos permitidos nos casos legais entrasse na pauta.

O SPW anuncia o lançamento de uma nova série de publicações em inglês, resultantes do processo de análise global iniciado em 2016 e intitulado SexPolitics:Trends&Tensions in the 21st Century.

Política e Prostituição

A prostituição tomou o palco do debate político nacional. No dia 7 de abril, quando o ex-presidente Lula foi preso, o empresário Oscar Maroni, proprietário da boate Bahamas, comemorou o fato numa festa provocando comentários críticos sagazes e repúdio imediato por parte do Movimento Brasileiro de Prostitutas.

Direitos das Mulheres

Três mulheres foram brutalmente assassinadas. Camila Lourenço foi esfaqueada por seu companheiro em Araraquara (SP). Jusselia Martins foi assassinada em seu local de trabalho pelo seu ex-marido em Planaltina (DF). E Andreza Souza dos Santos foi esfaqueada por seu ex-marido no shopping onde trabalhava na Tijuca (RJ).

No campo das boas novas, uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 5911) foi ajuizada pelo PSB pela eliminação da autorização do cônjuge para realizar o procedimento de esterilização voluntária, gravada na Lei do Planejamento Familiar de 1996. A cláusula foi objeto de ação de mesmo teor apresentada em 2014 pela Associação Nacional do Defensores Públicos.

Direito ao aborto e criminalização das mulheres

A investigação jornalística desenvolvida pelo Portal Catarinas identificou 331 processos penais relativos a auto- aborto no Brasil em 2017. Dentre os estados, São Paulo apresenta o maior crescimento de processos (25%) entre o período de 2015 a 2017. A pesquisa demonstra o papel protagonista das denúncias médicas – contrárias ao código de ética da profissão – na entrada no sistema penal por aborto.

No dia 28 de março, a Ministra Rosa Weber do STF convocou uma audiência pública para tratar sobre a ADPF 442, que tem como objetivo descriminalizar o aborto até a 12ª semana de gestação. Reconhecendo a importância de julgar com a contribuição da sociedade civil esse assunto crucial para o exercício dos direitos sexuais e reprodutivos, ela acolheu pedidos de participação nas audiências para o início do processamento esperado para junho.

Direitos LGBTTI

Entre março e abril foram registrados mais assassinatos e agressões envolvendo pessoas trans. Na zona norte do Rio de Janeiro, Matheusa, uma aluna da Escola de Artes Visuais da UERJ e modelo, foi executada e seu corpo carbonizado. Esse novo e brutal assassinato suscitou repúdio e protestos das mais diversas instituições (Veja nossa compilação). Antes disso, no dia 31 de março, em Taguatinga Norte (DF), Jéssica Oliveira, uma mulher trans, também foi morta. Pela primeira vez no país o inquérito do caso, encaminhado à Delegacia Especial de Repressão aos crimes de Intolerância (Decrin) da capital, foi tipificado como feminicídio. Em São Paulo, no dia 28 de abril, uma travesti foi assediada e intimidada por policiais porque não usava sutiã em um parque na cidade de São Paulo.

Já no âmbito das ações judiciais há registro de medidas contraditórias. De um lado, o Ministério Público Federal em Goiás ajuizou no dia 5 de abril uma ação para suspender a norma do Conselho Federal de Psicologia que proíbe a “terapia de conversão” de pessoas homossexuais, transexuais e travestis. De outro, a OAB – Acre vai questionar a inconstitucionalidade do Estatuto da Família e da Vida, que não contempla os direitos dos casais do mesmo sexo, aprovado pela Câmara de Vereadores de Rio Branco (AC) caso seja sancionado pela Prefeita. No mesmo estado, também por efeito de ação ajuizada pela OAB, a justiça de primeira instância permitiu a alteração do nome e sexo na certidão de nascimento de uma criança de três anos que foi identificada como sendo intersexual após um exame de cariótipo.  A decisão se, por um lado, é inédita, por outro, é controversa pois reifica o caráter binário de gênero a despeito das características sexuais singulares da criança.

No mundo

Violência sexual

A Índia, que registrou 40 mil estupros em 2016, foi palco de um episódio de extrema violência no dia 10 de abril em que uma menina muçulmana de oito anos foi vítima de um estupro coletivo e depois assassinada. A falta de resposta das autoridades mobilizou a sociedade indiana como há muitos anos não acontecia contra o partido majoritário hindu Bharatiya Janata (BJP), que posteriormente propôs e aprovou um decreto que prevê pena de morte a estupros de menores de 12 anos – uma medida criticada pelas organizações sociais que vêm os efeitos negativos. (Leia mais sobre casos de estupro coletivo no Brasil e seus desdobramentos).

Um crime similar aconteceu na França no dia 25 de abril, quando um homem com uma condenação anterior por estupro de menores, estuprou e assassinou uma menina de 13 anos, reacendendo o debate sobre o crime de estupro e a reincidência, o que pode levar o país, que já falava sobre endurecer as leis contra assédio sexual, a recrudescer a penalidade deste delito também.

Ainda mais significativa foi a reação intensa do movimento feminista espanhol contra a condenação final de abuso sexual a cinco jovens que compõe o grupo La Manada no dia 27, autores do estupro coletivo de uma jovem de 18 anos, cujo processo começou há dois anos. Em resposta a sentença extremamente criticada, criou-se uma comissão especial para rever o crime de estupro no Código Penal, mas cuja composição não conta com a participação de mulheres.

Ainda o #MeToo

As denúncias feministas contra ao assédio sexual chegaram à Academia Sueca,  que outorga o Prêmio Nobel,  e continuaram produzindo efeitos em outros terrenos. O prêmio Nobel de Literatura foi cancelado quando diversos membros renunciaram do comitê responsável por discordar da forma como a Academia havia reagido às acusações de dezoito mulheres contra Jean-Claude Arnault, marido de Karina Frostenson, que também faz parte dessa instância. No dia 26, Bill Cosby, alvo de mais de sessenta acusações de assédio, foi condenado a trinta anos de prisão por agressão sexual, sendo expulso da Academia do Oscar. No dia 27 de abril, as acusações contra o brasileiro Luiz Loures, diretor-adjunto da Unaids, foram agravadas quando Miriam Maluwa, diretora da Unaids na Etiópia, pediu a reabertura da investigação que o afastou do cargo em fevereiro.

No El País Brasil, Eliane Brum observando esse cenário, cuja intensidade não recrudesce, elaborou uma análise equilibrada e cautelosa sobre o perigo da adoção de “códigos de conduta e decência” e de ostracismo aos acusados como formas de lidar com o problema do assédio. Segundo ela: “Se é justiça que reivindicamos, a luta deve ser pela ampliação da escuta – e não pela determinação de quem pode e de quem não pode ser escutado. Nenhum silenciamento é justo. Nem mesmo o dos criminosos.”

 Direito ao aborto

Nossa atenção está posta na vizinha Argentina.  Desde o dia 10 de abril, a Lei de Interrupção Voluntária (LIV) está sendo processada no Congresso. Nesse momento, ocorre a oitava rodada de audiências públicas que contarão com 400 representantes da sociedade civil no total até o dia 31 de maio. Um grande número de artistas veio a público apoiando a proposta de lei que também conta conta com grande aprovação popular. (Leia mais aqui). No Brasil, Jean Wyllis escreveu sobre o debate argentino.

Boas notícias também vêm da Irlanda — um dos países europeus mais restritivo em relação ao aborto – recepcionará um referendo a fim de consultar a opinião pública sobre a descriminalização do aborto no dia 25 de maio.

Já nos EUA seguem os retrocessos.  Em Iowa, no dia 2 de maio, foi aprovada a lei mais restritiva em relação ao aborto, que criminaliza a prática a partir da detecção do batimento cardíaco. A lei contraria marcos nacionais e internacionais e poderá ser considerada inconstitucional.  Também no Chile, o presidente Piñera modificou o protocolo da lei aprovada em outubro do ano passado que prevê o aborto mediante três causas, ampliando a possibilidade da objeção de consciência.

Também em abril,  o Vaticano divulgou a exortação apostólica Gaudete et Exsultate que critica o “mundo secular e materialista”, clamando por justiça social – especialmente em relação à migração e à pobreza,  e estabelece um paralelo entre as lutas por justiça social e o repudio ao aborto.  Significativamente, a nova carta foi atacada pelo setores mais conservadores do catolicismo (Veja nossa compilação em inglês).

Direitos LGBTTI

Realizou-se na Costa Rica a 1ª Conferência Regional Latinoamericana e do Caribe de Pessoas Intersexuais, da qual resultou a Declaração de São José de Costa Rica, que expressa uma visão não hegemônica dos direitos das pessoas intersexuais e com variações congênitas das características sexuais.

No Chile, o processamento da lei de identidade de gênero na Comissão Mista no Congresso tem sido marcado por grandes tensões, pois os parlamentares conservadores querem impor enormes restrições à lei.

Já em Portugal, a despeito do protesto de médicos católicos, o Parlamento aprovou a nova lei de identidade de gênero, baseada na auto-determinação, que elimina o requisito de laudo médico para pessoas maiores de 16 anos, assim como restringe as intervenções cirúrgicas em crianças intersexuais.

No Caribe inglês, no dia 12 de abril, a Suprema Corte de Trinidad e Tobago derrubou a lei que criminalizava o sexo gay, defendendo a vida privada como direito. (Leia em inglês)

Já no norte da África e Meio Oriente, a Human Rights Watch e a Arab Foundation for Freedoms and Equality lançaram a campanha #NoLongerAlone (‘não mais sozinho’ em português) em que reúne testemunhos de ativistas lésbicas, gays, bissexuais e trans que desafiam a repressão política e o estigma social.

Também na África, Cabo Verde passa a fazer parte da Equal Rights Coalition, uma coalizão de estados nacionais que respeitam e promovem dos direitos das pessoas lésbicas, ‘gays’, transexuais, bissexuais e intersexuais.

Trabalho sexual

Os efeitos da lei de 2016 que criminaliza clientes de prostituição na França foram objeto de estudo realizado pela rede Médicos do Mundo, o qual revela deterioração nas condições de vida de profissionais do sexo, especialmente no que diz respeito à renda e à segurança pessoal. Novas análises também foram produzidas sobre as leis SESTA e FOSTA que, nos EUA, também estão alterando as condições de trabalho das pessoas envolvidas com o mercado sexual e empurrando-as para condições mais precárias.

Política do religioso na América Latina

Antes mesmo dos resultados das eleições presidenciais no Paraguai no dia 22 de abril, já estavam anunciados os efeitos potencialmente negativos sobre a política sexual, pois todos os candidatos, inclusive o da esquerda, tinham se manifestado contra o direito ao aborto e o casamento igualitário. A vitória do candidato conservador projeta um cenário sombrio para o país. (Veja nossa compilação)

 

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Artigos

Aborto

Argentinas compartilham vivências sobre a prática do aborto clandestino – Portal Catarinas

‘Las pentecostales también abortamos’, dice una pastora que expuso su opinión – Telam

Rabina y feminista: “la despenalización del aborto no es um tema religioso” – latfem

Las putas también abortamos – Emergentes

Sexualidade

Sexo: democracia ou autoritarismo – Revista Cult

A responsabilidade das mulheres – Projeto Colabora

Trabalho sexual em debate –  Manuela Tavares  para via esquerda

Gênero e feminismos

Judith Butler: “Yo quiero ser más débil” – el salto diário

Abril: aniversário de muitas lutas feministas – Mulheres em movimento – Folha Pernambuco

Cientista política analisa como a imprensa tem tratado os movimentos feministas no Brasil – UFMG

 

Multimídia

Organize sua esperança – Entrevista com Talíria Petrone – Jout Jout

Aborto: uma conversa necessária – TV Brasil

El poder de las mujeres y niñas oaxaqueñas – The New York Times

#euvoucontar, história 21 – Anis-Instituto Feminista de Bioética

 

Não perca!

Chamada de trabalhos para o I Colóquio Políticas da Performatividade (de 12 a 14 de junho) – UFMG – Prazo para submissão de resumos: 30 de maio.

Audiência Pública Direitos Humanos Parlasul que preparará o o Relatório anual sobre a situação dos Direitos Humanos no MERCOSUL e terá como tema principal “sistema carcerário e violência urbana”. – Dia 11 de maio, às 9h no Salão Nobre da OAB. Inscreva-se aqui.

Compilação de oportunidades na área de gênero – abril de 2018 – Pagu Unicamp

Curso de Curta Duração “Desobedecer ao gênero: fantasmas, monstros e outras genealogias excêntricas”, ministrado pelo Prof. Visitante do Programa de Pós Graduação em Psicologia, Dr. João Manuel de Oliveira – Instituto de Estudos de Gênero (UFSC)

 

Arte & sexualidade

Apresentamos o trabalho artístico e de contestação Corpo Estranho, de autoria da querida Matheusa. Matheusa presente hoje e sempre!

 

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