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Fala de ministro sobre sexo e maternidade é duramente criticada por feministas e pesquisadores brasileiros

A epidemia de microcefalia atingiu até o momento (30/11) 1.248 bebês no Brasil. A situação levou o Ministério da Saúde a decretar estado de emergência em todo o país para enfrentar o problema, que afeta o desenvolvimento do cérebro e pode causar desde sequelas psicomotoras e cognitivas até a morte. As causas da epidemia estão sendo atribuídas ao vírus da zika, doença transmitida pelo mosquito Aedes aegypti. De acordo com o Ministério da Saúde, a hipótese é corroborada pela presença do genoma do vírus no líquido amniótico de duas gestantes, assim como pelos relatos de mulheres que apresentaram sintomas da doença durante a gravidez.

Diante da gravidade da situação, cujos números devem seguir aumentando, uma fala do ministro da Saúde, Marcelo Castro, desencadeou duras críticas por parte de feministas e pesquisadores. Para o ministro, mulheres que pretendem engravidar atualmente devem analisar os riscos com a família e médicos antes de tomar uma decisão. E emendou, em tom moralista: “Sexo é para amador, gravidez é para profissional. A pessoa que vai engravidar precisa tomar os devidos cuidados. Ninguém deve engravidar ao acaso, deve ser feito um planejamento para uma maternidade responsável”.

O SPW buscou análises sobre as declarações do ministro entre feministas e pesquisadores.

“Como diria meu saudoso pai, a declaração do ministro da saúde sobre o grande número de casos de microcefalia detectados em Pernambuco foi decididamente infeliz. É lamentável que o sr. ministro tenha desresponsabilizado o sistema público de saúde de suas obrigações no campo da vigilância epidemiológica e da prevenção em saúde, transferindo-as para as mulheres que desejam engravidar. Entretanto –  passados trinta anos desde que o Brasil inventou uma política pioneira de saúde integral da mulher – é decididamente melancólico que a autoridade sanitária máxima do país trate as  mulheres como sexualmente irresponsáveis e ‘profissionalize’ a reprodução biológica como tarefa social. Não sem razão os feminismos brasileiros tomaram as ruas em 2015.”

Sonia Corrêa – co-coordenadora do Observatório de Política e Sexualidade                                     

“Diria que, profissionalmente, o ministro deveria investir na distribuição de mosquiteiros e determinar que no nordeste, transar na rede fica proibido, porque o seguro-mosquiteiro não cobre a área com a devida eficácia.”

Jandira Queiroz – assessora da Anistia Internacional Brasil

“Penso que é mais uma manifestação do pensamento conservador em relação à sexualidade que tomou conta do governo e do Estado brasileiros. A fala do ministro caracteriza o sexo como lugar de perigo, como uma função menos nobre do que outras – como a maternidade. Remete também a uma visão moral na qual as mulheres não têm direito ao prazer, reforçando estereótipos de gênero. Além disso, responsabiliza as mulheres que tiveram ou vierem a ter bebês com microcefalia, acusando-as de negligência e leviandade ao invés de trazê-las para um debate franco e aberto sobre o problema de saúde pública pelo qual o país passa. Não me surpreende a fala do ministro, embora deva ser repudiada e condenada.”

Veriano Terto – assessor de projetos da Associação Brasileira Interdisciplinar de Aids

“Sr. Ministro a julgar pela sua afirmação somos tod@s amador@s! Inacreditável que em pleno século XXI, o ministro prefere responder com argumentos morais sobre um tema de saúde pública e vai mais além, pois transfere para os cidadãos e cidadãs a responsabilidade de contrair o vírus ao invés de se comprometer a tomar medidas de precaução com base em evidencias cientificas para diminuir a epidemia”

Beatriz Galli – Plataforma Dhesca Brasil e ONG Ipas

“Creio que as declarações do ministro expõem mais uma vez as fragilidades e barreiras que as mulheres enfrentam no exercício da sexualidade e reprodução há séculos. Como planejar se não temos métodos 100% eficazes e disponíveis? Como enfrentar a gravidez indesejada? Como cuidar se não temos nem cobertura satisfatória de serviços adequados de pré-natal? Sem falar na qualidade…Recai sobre nós mulheres como sempre a responsabilização pela maternidade, muitas vezes imposta. Sexo é para o prazer. Reprodução é para quem quer. Doença é para cuidar, mas epidemia aqui no Brasil tem sido para incompetentes.”

Paula Viana – coordenadora do Grupo Curumim



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