Cidadania trans
O “Seminário Internacional Desfazendo Gênero: subjetividade, cidadania e transfeminismo”, organizado pelo Núcleo Tirésias (Núcleo Interdisciplinar de Estudos em Diversidade Sexual, Gênero e Direitos Humanos/UFRN), divulgou moções (ao final do texto) cobrando do Estado brasileiro, especialmente o Congresso e o Executivo, ações em prol dos direitos da população trans, vítima cotidiana de violência de diversos tipos.
As moções tratam da despatologização das identidades trans, demandando uma mudança da abordagem psiquiátrica em prol da autonomia e auto-determinação das pessoas em suas vivência de gêneros; do PL 5.002/2013, que permite a retificação do prenome e do gênero nos documentos de identidades sem a necessidade de diagnóstico psiquiátrico ou de cirurgia; e, por fim, da experiência trans nos espaços escolares, exortando que as pessoas trans sejam tratadas da forma como se auto-identificam.
O modelo medicalizante constitui um marcador importante no contexto de discriminação das pessoas trans, de acordo com a socióloga Berenice Bento, coordenadora do Núcleo Tirésias. “A patologização, em si, já demarca uma diferença, pois enquadra os indivíduos trans sob a alcunha de doentes. Sabemos que a própria medicina é também uma prática socialmente marcada e, portanto, acaba incorporando noções de normalidade e anormalidade que são arbitrárias. Logo, tudo aquilo que escapa às regras hegemônicas se destaca como doentio, passível de correção. O que é um corpo normal? Quem pode definir o que é melhor para uma pessoa em termos de experiência de gênero? É preciso avançar sobre o modelo patologizante”, argumenta Berenice Bento.
Para a socióloga, a exclusão da cidadania das pessoas trans se concretiza em diversos espaços e momentos da vida. Não há, no Brasil, lei que garanta a mudança de nome, como já há na Argentina desde o ano passado. As políticas públicas estão marcadas pelo viés médico. “No campo da educação, da saúde, do mercado de trabalho, o que impera é o desrespeito à dignidade desses cidadãos. Temos dificuldades de tratar tal temática com o poder público”, afirma Berenice Bento, que lembra que as moções já foram entregues ao governo federal e serão articuladas com congressistas que trabalham com os direitos sexuais, como os deputados Jean Wyllys (PSOL-RJ) e Érika Kokay (PT-DF).