Há quase um ano atrás, o presidente norte-americano Barack Obama suspendeu a “regra da mordaça global”, que impedia que o governo dos EUA financiasse organizações que realizem ou ou “promovam” o aborto. Essa mudança, combinada com a nomeação de Eric Goosby para o cargo de coordenador global e ’embaixador’ da politica americana de AIDS sinalizou que o governo dos EUA estava se tornando menos conservador na sua estratégia de luta contra a pandemia da AIDS. Essas mudanças trouxeram grande esperança que a “Política ABC” e a “cláusula da prostituição” seriam eliminadas como requisito de financiamento. Contudo e lamentavelmente até agora nenhuma delas foi eliminada.
A reautorização do Ato de Liderança Global dos EUA contra HIV/AIDS, Tuberculose e Malária promovido pelos deputados Tom Lantos e Henry J. Hyde e aprovado em março 2008 ( ou seja alguns meses antes da eleição de Obama) dá diretrizes ao finanacimento para HIV/AIDS até 2013 e alterou a lei original do PEPFAR de 2003, que exigia que pelo menos 33% de todos os fundos que estão aplicados como esforços de prevenção fossem gastos em programas de abstinência até o casamento [i]. A lei 2008 exige que o coordenador global de AIDS envie um relatório explicativo ao Congresso, no prazo de 30 dias, explicando por que menos de 50% dos fundos de prevenção dos EUA deveriam ser gastos em “atividades de promoção da abstinência, adiamento da iniciação sexual, defesa da monogamia, da fidelidade e da redução de parceiros” [ii].
Embora Goosby, em seu sumário executivo da estratégia de Obama para o PEPFAR nos próximos cinco anos, tenha indicado que apenas programas baseados em evidência seriam implementados daqui para frente, a abordagem ABC para a prevenção continua sendo o parâmetro oficial da política. Segundo o site do PEPFAR: “o PEPFAR apóia os mais abrangentes programas de prevenção baseado em evidência no mundo, visando intervenções baseadas na epidemiologia da infecção pelo HIV em cada país. Estes incluem a redução da transmissão sexual com a estratégia do ABC (abstenção, ser fiel e usar de forma correta e consistente preservativos), a prevenção da transmissão de mãe para filho/a e da transmissão do HIV através de sangue contaminado e injeções, e circuncisão masculina” [ iii].
Até 8 de dezembro de 2009, Eric Goosby não havia dado nenhuma resposta definitiva quanto a ênfase que será dada a abstinência ou aos preservativos, nem tampouco havia esclarecido se preservativos seriam ou não distribuídos para os/as pacientes nos hospitais religiosos que no momento se recusam fazer tal distribuição (NYT). A lei do PEPFAR de 2008 diz que “não será exigida da organização, mesmo aquelas de cunho religioso, que seja elegível para receber assistência, como uma condição para receber essa ajuda, que as mesmas (A) endossem ou utilizem uma abordagem multisetorial ou abrangente da luta contra o HIV/AIDS, ou (B) aprovar, utilizar, fazer um encaminhamento, integrar-se ou participar de qualquer programa ou atividade em relação ao qual a organização tem uma objeção religiosa ou moral” [iv].
Goosby, no entanto, sugeriu que o modelo ABC pode eventualmente ser reformulado e que a administração de Obama pode ser mais flexível do que a administração de Bush quando se trata de financiamento de programas de promocão da abstinência. Em 4 de dezembro, num debate público com a Fundação Família Kaiser, Goosby foi questionado sobre como as políticas abstinência serão melhor comunicadas para as pessoas que trabalham no campo. Ele respondeu: ‘Nós estamos prestes a entrar em um diálogo com o campo em torno de toda a política e através disso, muito rapidamente, vamos identificar a necessidade de orientação específica. É evidente que esta será uma área que vamos precisar de orientações específicas’ [v].
Embora Obama já tenha sinalizado sua intenção caminha no sentido de uma abordagem baseada em evidências para combater o HIV/AIDS, tanto a abordagem ABC para a prevenção, quanto a cláusula da prostituição continuam vigentes. Para enfatizar a distribuição de preservativos, Goosby será obrigado a a apresentar um relatório para justificar a eventual decisão de gastar menos do que 50% dos fundos de prevenção em programas “AB” (e não está ainda claro se ele fará isso ou não). Para eliminar a cláusula da prostituição, a própria lei precisará ser reformada. Não há nenhuma indicação de que isso vá acontecer tão cedo.
Referências (em inglês)
[i] http://frwebgate.access.gpo.gov/cgi-bin/getdoc.cgi?dbname=108_cong_public_laws&docid=f:publ025.108.pdf
[ii] http://www.pepfar.gov/documents/organization/108294.pdf
[iii] http://www.pepfar.gov/about/c19387.htm
[iv] http://www.nytimes.com/2009/12/09/health/policy/09aids.html
[v] http://globalhealth.kff.org/~/media/Images/KGH%20Home/120409_TownHall_Transcript.pdf